CONHEÇA TODAS AS CARTAS
E a morte sem critérios
deu seu golpe derradeiro,
roubou a vida de Zé
e a do cruel fazendeiro.
Ninguém foge do destino,
seja simples, seja fino,
seja o limpo ou o imundo,
esse encontro é garantido
e por mais bem escondido
ela encontra todo mundo.
– “A lição que a morte deu”, de Bráulio Bessa
Tradições populares relacionadas à morte atravessam, de uma maneira ou outra, o imaginário de todos os povos da terra. Pode ser na forma da descoberta da finitude da vida, do enfrentamento de seres tétricos, capazes de abreviar nossa existência, ou mesmo como ritos e práticas de encomenda e despedida dos falecidos. No entanto, existe uma manifestação peculiar da morte que tem especial presença nas narrativas orais brasileiras: a morte personificada; a figura sombria, por vezes esquelética, pronta para ceifar mais uma alma.
A tradição compreende, com facilidade, a justiça da Morte, com M maiúsculo. Vários textos populares carregam o mote de que a morte leva, igualmente, todos: crianças e velhos, ricos e pobres, bons e maus. Ninguém escapa do seu jugo… O que não impede o ser humano de tentar.
Câmara Cascudo, em “Contos Tradicionais do Brasil”, posiciona os contos do Ciclo da Morte como diametralmente opostos aos do ciclo do Diabo Logrado. Se, neste último, o desenlace da história é o uso da astúcia e da esperteza como arma para vencer o Maligno, a mensagem das histórias envolvendo o logro da Morte é a mesma de sempre: o falecimento do protagonista. Afinal, esse destino é inexorável.
Nas narrativas de homens espertos que tentam se valer sobre a Morte, um dos clássicos é o conto de seus laços de compadrio. O conto fala de um homem que, sem encontrar alguém que batizasse seu sétimo filho, ofereceu o menino para ser afilhado da Morte. Ela, em agradecimento pela confiança, deu ao homem a capacidade de enxergá-la, para saber quando se aproximasse. O rapaz passou, então, a enricar como médico – desenganando pacientes quando via o esqueleto se aproximar.
Quando sua hora chegou, no entanto, pediu um favor em nome de seu filho: que só pudesse morrer quando acabasse de rezar um pai-nosso. Morte concedeu esse voto de confiança, mas o homem começou a oração e pretendia nunca terminar. Morte foi paciente, passaram-se anos e mais anos, até que um dia o homem benzeu-se e orou a Deus. Morte apareceu na mesma hora e levou-o para seus domínios.
Outra manifestação clássica da Morte em nossa cultura popular é o seu chamado misterioso. Dizem que, quando você escuta alguém chamar seu nome, mas não sabe de quem é a voz – ou de onde ela vem –, o mais seguro é não responder. Pode ser a Morte chamando, e aquele que responder terá sua vida abreviada.
CHAMADO MISTERIOSO
Tipo: Desafio
Elemento: Firmeza
"Escutou seu nome e não sabe quem foi? Não responda. Pode ser a Morte!"
Condição de Vitória:
Some 15 ou mais PVs do seu lado do campo. Quando o valor for atingido, todas as suas cartas em campo vão para o Beleléu.
Artista: Daniel Brás
– AZEVEDO, Ricardo. Contos de enganar a morte. Rio de Janeiro: Ática, 2003.
– CASCUDO, Luís da Câmara. Contos Tradicionais do Brasil. São Paulo: Global, 2015.
Uma das superstições mais conhecidas do Brasil. A crença diz que não se deve deixar os chinelos emborcados sob o risco de atrair azar. Em muitas versões este azar tem um foco específico: a morte da mãe do dono dos calçados.
Um chinelo é um tipo de sandália que deixa o pé mais livre. Consiste em um solado preso por uma tira reta ou em forma de Y. Grande marco para a popularização deste calçado no Brasil foi o ano de 1962, quando a São Paulo Alpargatas Company lançou a primeira edição das Havaianas, com as típicas cores azul e branca.
De onde vem esta tradição? O dicionário de Cascudo foi escrito em 1954, e lá não se fala em chinelos. No Dicionário do Folclore Brasileiro, de Luís da Câmara Cascudo, encontramos a informação no verbete “Sapatos”. O sapato emborcado, diz ele, está chamando a morte para quem o uso. Afinal, “a imagem sugere o corpo em posição inversa à normal, com a cabeça para baixo e os pés para cima”.
É inclusive assim, de bruços, que se enterravam os sacrílegos e pessoas cuja alma deveria ser punida. Com a barriga virada para o solo, sua trajetória é cada vez mais fundo na terra.
Com a popularização dos chinelos entre as camadas populares do Brasil, a superstição do sapato emborcado passou a ser endereçada a eles. E a figura da mãe como alvo do azar? Talvez por uma relação que integra na crença a imagem da dona de casa organizada – que não aceitaria a bagunça de um calçado emborcado debaixo do seu próprio teto.
CHINELO VIRADO
Tipo: Saberes
Elemento:
Habilidade:
Efeito:
Citação:
Artista:Tiago Holsi
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Pra caçar na sua mata
Só com permissão se tinha
Ou entrava na chibata
Era assim com a Fulozinha
Nessa surra de arder
Ninguém conseguia ver
As lapadas de onde vinha
– Comadre Fulozinha: O Romance da Serra das Flechas
Vanderley de Brito
Comadre Fulozinha ou Florzinha é o nome pelo qual é conhecida esta protetora das matas, que age especialmente pelo Nordeste do país. Seu epíteto, “Comadre”, é uma estratégia típica do povo de eufemizar as relações com as visagens de que tem medo. Assim, tornando-a próxima, a partir de um vínculo pressuposto de compadrio, tentam evitar seu castigo.
Existem alguns relatos que dão a ver uma origem para a Comadre. A maioria fala de uma menina cabocla com pouco mais de 10 anos de idade que vivia em um lar violento. Após a morte de sua mão, o pai que bebia muito a abandona na mata. Não sem antes lhe dar uma surra que deixa suas costas todas lenhadas.Uma vez na mata, sozinha, ela se encanta.
E qual é a aparência da visagem? Os registros são imprecisos, mas normalmente se fala que mantém a aparência de menina, andando nua com longos cabelos desgrenhados que queimam como urtiga (ou até mesmo feitos de urtiga). São eles que a Fulozinha utiliza para chicotear os invasores, deixando-os também lenhados com os estalos.
Falando em cabelo, uma das grandes características da Comadre é a de dar nó na crina e nas caudas dos cavalos. Dependendo da região do país, o mesmo comportamento será atribuído a Bruxas ou Sacis. E, assim como este último, a Comadre também é notória assobiadora.
No Dicionário do Folclore Brasileiro, fala-se que ela é capaz de tomar a forma de animais (que tenham o mesmo tamanho que a menina), virar moça nova e até um garoto. Surra cães e persegue crianças fujonas. Quando presenteia alguém, coloca uma regra: não se pode partilhar o agrado com mais ninguém.
Ela é afeita a agrados com cachaça e nacos de fumo. Oferecer cigarro também funciona, e um caçador entrevistado por Ivo Fernandes de Souza tinha seu próprio ritual: acendia um cigarro e baforava fumava três vezes para esquerda, três para direita e três para cima. Então colocava o cigarro com a brasa dentro da boca e fumaçava para fora. Feito isso, colocava o cigarro em um toco para a Comadre e seguia para a caça.
Outra forma de agradá-la é com o tradicional mingau de trigo, sem sal e nem açúcar. Há narrativas em que uma mulher, enciumada pelo companheiro sempre pedir auxílio da Fulozinha, colocou pimenta no mingau da visagem. Foi sua perdição… A Comadre também detesta que a chamem de Caipora, e vai castigar duramente quem a desrespeitar.
É interessante pontuar que Comadre Fulozinha também está presente entre as encantarias da Jurema Sagrada – tradição religiosa afro-indígena muito forte no norte e nordeste do país. Lá ela atende também como Maria e, vale comparar, em Cascudo, lemos que este é um nome que Fulozinha não aprecia por ser coisa de santo. De qualquer forma, em um de seus pontos alerta:
Eu sou a Fulô das matas, nas matas eu ando sozinha!
Você me chamou comadre, mas eu sou Maria Florzinha.
Eu sou a fulô da mata, pra que mandou me chamar?
Você me chamou caipora… Caipora você será!
A ameaça final é um duplo sentido com o próprio sentido popular do termo Caipora, adjetivo usado para designar alguém que vive em infortúnio, azar e tristeza. Estar caipora; sofrer de “caiporismo”.
COMADRE FULOZINHA
Pontos de Força:
Pontos de Vida:
Tipo:
Elemento: Terra
Habilidade:
Efeito:
Citação:
Artista: Germana Viana
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Chama-se cordelista aquele que domina o ofício da produção de folhetos de cordel. Os cordéis tem um lastro europeu que se relaciona tanto com sua forma de produção (que se dá com o surgimento da imprensa) quanto com o seu conteúdo: a tradição dos romanceiros em verso, narrando histórias que ecoam motes medievais.
Outro elemento característico dos folhetos de cordel são suas ilustrações; produzidas e reproduzidas por meio da técnica da xilogravura. Xilon, em grego, significa madeira. As placas de árvores como a cerejeira, cedrinho, peroba ou cedro são entalhadas com goivas para gerar as matrizes das artes. Num segundo momento, a tinta será espalhada na superfície da matriz para só então ser fixada no papel.
O resultado desta prensa artesanal são imagens formadas a partir de um “negativo”, gravadas em preto e branco. Gilmar de Carvalho, em “Xilogravura – Doze escritos na madeira” reflete que este contraste entre as duas cores, sem meios tons, expressa na arte muito da dramaticidade dos seus textos. Histórias quase barrocas, com inspiração dicotômica, que mostram a disputa do bem contra o mau, do certo contra o errado.
Tido como pioneiro desta arte no Brasil, o pernambucano Leandro Gomes de Barros produziu mais de 200 obras ao longo de sua vida. Suas inspirações eram romances de cavalaria, e ajudou a cravar no imaginário nordestino histórias como as de Juvenal e o Dragão, as batalhas dos paladinos de Carlos Magno contra o gigante ferrabrás e muitas outras.
Para além de uma expressão estética e artística, os folhetos de cordel são também expressões comunicativas e informativas. Nelson Werneck Sodré, ao analisar a história da imprensa no Brasil, aponta que a popularização do cordel no Nordeste está também ligada a interiorização dos maquinários de impressão obsoletos para os grandes centros. Os estudiosos da folkcomunicação reconhecem os cordelistas como jornalistas populares, que utilizam dos meios e estratégias que têm à sua disposição para comunicar sobre o tempo presente.
Assim, encontramos cordeis que falam sobre pelejas notórias, sobre viagem do homem à lua, doenças e seus tratamentos, decisões políticas e vitórias esportivas. Ao mesmo tempo, temos aqueles que utilizam esse meio profundamente jornalístico para produzir desinformação; as chamadas “fake news”. Exemplo disso foi o caso do cordelista baiano Cuíca de Santo Amaro (1907-1964), que escrevia cordéis acusatórios, levantando supostas denúncias – frequentemente genéricas – contra os ricos da cidade.
Cuíca escrevia, muitas vezes, sob o pagamento de um interessado. Como no trecho abaixo, em que vai expor um fiscal: “Um vereador de pojuca, que não tem medo de visagem, o qual para brigar com qualquer um tem coragem pagou-me para eu divulgar a seguinte reportagem”. Outras vezes, tornava seu folheto quase que uma chantagem. Em “O Médico Tarado”, narra a história de um médico abusador e promete revelar, na semana seguinte, o nome da pessoa. A sequência nunca saiu, e dizem que seu silêncio era comprado.
Outro elemento interessante é que no verso de seus cordéis, Cuíca imprimia um habeas corpus preventivo para mostrar aos policiais que ameaçavam recolher suas publicações.
CORDELISTA
Pontos de Força:
Pontos de Vida:
Tipo:
Elemento: Vento
Habilidade:
Efeito:
Citação:
Artista: Caique Pituba
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São Cosme mandou fazer duas camisinha azul
No dia da festa Dele, São Cosme quer caruru
Oi, vadeia, Cosme (vadeia)
Eu tô vadeando (na areia)
– Ponto de Cosme e Damião
Segundo a tradição, Cosme e Damião viveram e morreram na Ásia Menor, por volta do século IV. Médicos e cristãos, atendiam a população sem cobrar nada, convertendo muitos pacientes. Teriam sido, por isso, condenados à morte por bruxaria. A generosidade que demonstravam inspira no povo a tradição dos doces dados de presente às crianças, entregues em promessa aos santos.
Por parte do catolicismo, o dia oficial de São Cosme e São Damião é 26 de setembro. Costumava ser dia 27, em homenagem a inauguração da basílica dos gêmeos em Roma. No entanto, como o 27 também é dia de São Vicente de Paula, em 1969 o papado fez uma atualização no calendário litúrgico, consagrando o dia 26.
Essa pode ser uma determinação institucional, o que sempre passa ao largo das práticas do povo – que continuou celebrando no dia 27 também. Na prática temos dois dias, o que parece adequado para os gêmeos.
Falamos do lastro católico, mas é preciso também falar da presença dos santos no imaginário afro-brasileiro. E ele está ligado diretamente ao período colonial, quando o sincretismo tornou-se estratégia para que o povo negro pudesse manter sua cultura e religião.
Foi assim que os santos foram sincretizados com os Ibejis, orixás-criança e que também são gêmeos, responsáveis pela proteção dos pequenos. Muitas vezes os Ibejis são tomados por Erês, mas cabe a distinção: Erês são entidades crianças, mas apenas os Ibejis são orixás.
Em algumas regiões, como na Bahia, é comum que no dia 27 ocorra uma outra prática cultural ligada aos Ibejis/Cosme e Damião: a tradição do caruru dos sete meninos. Caruru é um prato feito com quiabo, camarão seco e azeite de dendê, que na data é servido com acompanhamentos como frango cozido, feijão fradinho e banana da terra.
Quem faz a promessa, deve oferecer o preparado deve então oferecê-lo a sete crianças, que comem com as mãos e depois as limpam na saia de quem ofertou o caruru.
COSME E DAMIÃO
Tipo: Saberes
Elemento:
Habilidade:
Efeito:
Citação:
Artista: Roe Mesquita
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Dorme, neném,
Que a Cuca vem pegar
Papai foi pra roça,
Mamãe pro cafezal
– Uma das versões da cantiga da Cuca
Um dos personagens mais notórios da tradição oral brasileira, a Cuca é uma criatura que pertence ao âmbito das cantigas populares. Desta forma, assim como no caso do Boi-da-cara-preta, não há registros tradicionais da aparição ou encontro com uma Cuca. “Não há sobre ela episódios nem localizações. Está em toda a parte, mas nunca se disse quem carregou e como o faz”, diz Câmara Cascudo. Sua existência está restrita à cantiga de ninar que embala as crianças pequenas.
Outra observação interessante é quanto a distinção entre a figura da Cuca na cultura popular brasileira e a sua figura midiatizada e presente na cultura pop. Basta olhar para sua cantiga (e mesmo suas variações) que não vemos qualquer menção a uma aparência física.
Para Câmara Cascudo, isso se deve ao fato dela estar ligada ao “ciclo da angústia infantil”. Como é uma narrativa cantada para crianças muito pequenas, a aparência não importa, apenas sua função: sequestrar e devorar. É o mesmo princípio do Bicho Papão. Por isso, não haveria uma forma definida.
Com a intersecção com o imaginário das bruxas, tidas como sequestradoras e devoradoras de criancinhas (vide contos de fada, como João e Maria), a Cuca sem forma acabou tomando forma bruxólica.
Sua imagem se complexifica, no entanto, a partir da influência da obra de Monteiro Lobato. A Cuca aparece como personagem apenas do primeiro livro: “O Saci” (1921). No entanto, a “rainha das coisas feias” – como o autor descreve – ganhou o público, especialmente com as interpretações artísticas que cravaram sua forma de bruxa-jacaré.
Na obra, Lobato a descreve como habitante das profundezas do Capoeirão dos Tucanos. A Cuca dorme apenas uma noite a cada sete anos (o seu grande ponto-fraco) e é capaz de assumir formas diferentes. É assim que se disfarça de velha e transforma Narizinho em pedra. Quanto à aparência física, Lobato diz que era uma bruxa que tinha cara de jacaré e garras nos dedos como os gaviões.
De onde teria vindo a imagem reptílica? Há quem acredite que Lobato criou seu personagem inspirado pelas festas de Corpus Christi na Península Ibérica. Nestes eventos, São Jorge aparece enfrentando um dragão-tartaruga, a Coca, ou Cuca-Fera. O embate relembra a vitória sobre o mal, que sempre deve ser revivida.
Outra referência é quanto a própria palavra, Coca. Dizem que sua raiz é celta, que na Galícia vai dar origem a “crouca” (cabeça), que vai se derivando em Coca e em Coco. Para espantar maus espíritos, era comum que os portugueses usassem abóboras esculpidas com uma vela dentro e a chamassem Coca. Com o tempo, o bicho-papão que assombra as crianças e aguarda em cima do telhado no país lusitano também passou a ser chamado Coca. Em italiano e espanhol, temos o Coco, termo que também indica um papão.
Por fim, uma curiosidade: o coco da bahia recebeu esse nome dos colonizadores justamente por lembrar uma cabeça, Coco, Coca, Cuca. Cabeça, Papão, Réptil. É deste emaranhado de imaginários que tenhamos a nossa Cuca.
CUCA
Tipo: Desafio
Elemento:
Habilidade:
Efeito:
Citação:
Artista: Fred Rubim
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Curucucu é um dos nomes que se dá a um brincante mascarado típico das cavalhadas da cidade de Pirenópolis (GO), localizada há cerca de 130 km da capital Goiânia. Existem cavalhadas por todo o território nacional, mas os mascarados desta região são conhecidos pelas suas galhadas extravagantes, sempre muito enfeitadas e coloridas.
As cavalhadas são festas populares em que se faz uma representação das guerras entre cristãos e mouros. Este é um elemento bastante comum em nossa cultura popular e tem herança diretamente portuguesa. “Mouro” vem da língua latina e significa “escuro”; era, também, o nome que genericamente se dava aos povos islâmicos que invadiram a Península Ibérica no século VIII e ocuparam territórios de Portugal e Espanha até o fim da Idade Média, já no século XV.
Durante a cavalhada, essa guerra é reencenada a partir do confronto entre dois exércitos, tendo como grande inspiração a literatura – especialmente um poema épico chamado “A Canção de Rolando”. Do lado azul, está Carlos Magno e os 12 pares da França, sua guarda de elite conhecida como os “paladinos”. Do lado vermelho, estão os mouros, muitas vezes representados por um rei gigante conhecido como Ferrabrás.
Existem várias formas de festejar as cavalhadas pelo Brasil. Em alguns lugares, o centro da festa são as disputas de habilidade – herança dos torneios medievais que serviam de entretenimentos para os cavaleiros nos intervalos das guerras. Nesse contexto, o destaque vai para o “jogo da argolinha”, em que o cavaleiro deve usar uma lança para coletar as argolas presas pelo campo.
Outra maneira de se celebrar o festejo é dando maior foco na teatralização da disputa, com os brincantes assumindo as funções de personagens. Em Pirenópolis, temos uma mescla entre teatro e prova de habilidade, com os dois exércitos sendo formados por um rei, um embaixador e dez cavaleiros. Outra peculiaridade de Pirenópolis é a data: tradicionalmente, a cavalhada acontece juntamente às celebrações da Festa do Divino, no dia de Pentecostes.
São três dias de evento na cidade goiana, e, em cada um deles, a cavalhada avança em seu enredo e em suas apresentações. A trama começa com a descoberta de um espião mouro em terras cristãs, representado por um brincante com máscara de onça que é morto pelo inimigo. Cada exército assume seu terreno, representando seu castelo, e é visitado pelo oponente, que tenta convencê-lo a mudar de religião. Com o fracasso dos diálogos, a guerra começa.
As disputas se seguem durante todo o segundo dia, quando os cristãos cercam os mouros, que são rendidos e convertidos ao cristianismo. No terceiro dia, não há mais guerra, apenas confraternização e provas de destreza.
Durante todos estes dias de festa, os Curucucus devem se manter anônimos. Nem mesmo os membros de sua família devem saber quem são os mascarados que aparecem, entre uma prova e outra, para provocar e divertir a plateia entre as provas de habilidade. Seu nome é uma onomatopeia e vem dos gritos que eles soltam para causar baderna.
CURUCUCU
Pontos de Força: 4
Pontos de Vida: 3
Tipo: Gente
Elemento: Noite
Habilidade:
Quando esta carta é invocada, você pode trocar o Desafio ativo e enviá-lo para o fundo do baralho.
Efeito: Troca
Citação: "Cristãos contra mouros? Que nada. Eu vim para ver os mascarados!"
Artista: Ikarow
– BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Cavalhadas de Pirenópolis: um estudo sobre representações de mouros e cristãos em Goiás. São Paulo: Oriente, 1974.
– GONZALEZ, Lélia. Festas populares no Brasil. Rio de Janeiro: Index, 1987
– SPINELLI, Celine. Cavalhadas em Pirenópolis: tradições e sociabilidade no interior de Goiás. Religião e Sociedade, v. 30, n. 2, 2010. p. 59-72
O Maracatu é um folguedo que surge no Brasil entre as populações negras, inspirado nas danças e religiões afro, mas também com influência indígena e mesmo católica. Ocorre especialmente durante o carnaval, mas seus ensaios (as sambadas) ocupam as comunidades ao longo de todo o ano.
Seu lastro, como o de uma série de outros folguedos do norte e nordeste brasileiros, tem origem nas coroações do rei e da rainha do Congo, que eram promovidas pelas Irmandades de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos. Entendidas como pontos de resistência para o povo negro, as irmandades envolviam-se na compra de alforrias, enterro de negros, ajuda financeira aos necessitados e, claro, nas festas da coroação dos reis do Congo. Com a abolição da escravatura, as irmandades perdem relevância e a festa da coroação deriva em congadas por um lado e em maracatus por outro.
Uma segunda situação importante para compreender o folguedo se deu nas décadas de 1930 e 1940, durante o governo de Agamenon Magalhães em Pernambuco, que exerceu forte perseguição aos cultos afro-brasileiros, levando muitas pessoas de religião para a cadeia e fechando terreiros. Durante esse período, o Maracatu Nação se fortaleceu muito, uma vez que os mestres – que não podiam ter liberdade de culto – ainda conseguiam permissão para brincar o Maracatu, fazendo com que o folguedo fosse uma alternativa necessária para praticar candomblé ou o culto da jurema. É por isso que muitos mestres em Pernambuco consideram que o Maracatu é primeiro culto e depois festa.
Elemento fundamental dos Maracatus é a corte, composta por rei, rainha e seus embaixadores. No entanto, a figura principal mesmo do Maracatu Nação não é a rainha, mas sim a Calunga. “Primeiro ela, depois eu”, diz a rainha Marivalda dos Santos sobre a ordem dos enfeites e dos cuidados. Trata-se de uma boneca mágica, normalmente feita de madeira, mas também podendo ser feita de pano ou mesmo osso. A Calunga é preparada em uma série de rituais de proteção poderosíssimos, feitos pelo sacerdote e permitido apenas a iniciados, e é o coração do grupo. Dizem que brincar o Maracatu atrai muita energia negativa de quem inveja a brincadeira, e que sem a boneca essa energia cairia toda sobre os festeiros. Sem ela, o Maracatu não sai. A boneca é carregada pela Dama do Paço (“Nega da Calunga”, no Ceará), uma figura que sempre sai vestida com as cores do Orixá de quem é filha.
O significado de seu nome é um grande amalgama, dependendo da língua. Kalunga pode ser tanto o nome de um herói mítico quanto o caminho que liga o mundo dos vivos e dos mortos. Em quimbundo, a palavra significa “Mar” ou Águas Profundas, criando uma relação simbólica de ponte com aquilo que está distante, além-mundos. Há quem diga que o totem da boneca representa uma “rainha já morta”, e podemos entender isso como uma relação direta com os ancestrais. Recorrer à força da calunga no Maracatu, essa festa da coroação, é estar sob a égide dos ancestrais a zelar pelo reinado.
Às vezes essa rainha é também distorcida: no Maracatu Leão Coroado, um dos mais antigos do Recife, a Calunga Dona Isabel surge como homenagem à princesa Isabel. Há registros de Calungas que incorporam tanto masculino quanto feminino, sendo ao mesmo tempo reis e rainhas. Talvez isso seja a deixa para entender outro elemento recorrente: a travestização dos personagens.
DAMA DO PAÇO
Pontos de Força:
Pontos de Vida:
Tipo:
Elemento: Água
Habilidade:
Efeito:
Citação:
Artista: Deoxy
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Parte do ciclo da festa junina, João é certamente um dos santos mais conhecidos do Brasil. Sua figura, frequentemente representada como uma criança de cabelos encaracolados, vestes pastoris e um lindo cordeirinho difere muito do profeta grave e de fim trágico que teria sido. Como este santo, seja criança, seja velho mestre, parte da Jordânia para inspirar uma festa caipira aqui no Brasil?
Os caminhos da cultura são muitos. Para começar precisamos entender quem foi João, o Batista. O último dos profetas, ele nasce seis meses antes de Jesus para preparar seu caminho. Seu nascimento, por si só, já seria um milagre. Sua mãe, Isabel era uma mulher de idade e nunca havia tido uma criança. Quando o anjo apareceu para seu pai, Zacarias, a descrença foi tanta que o homem acabou ficando mudo como castigo por duvidar dos desígnios divinos.
João, mais tarde, se tornaria um grande pregador no deserto – convertendo muitos com suas palavras. Dois momentos-chave marcam sua vida adulta: a batismo de Jesus, que ele realiza mergulhando-o nas águas do Rio Jordão; e sua execução por Herodes. O profeta já estava preso por ter pregado contra o rei, mas dizem que foi um pedido da princesa Salomé que selou de vez sua condenação. São João foi decapitado e teve sua cabeça entregue como presente. Cabeça esta que, ainda hoje, algumas igrejas pela Europa alegam possuir preservadas na forma de relíquia.
Luiz Antônio Simas aponta que João está sempre com um cordeirinho em referência a ter sido ele a batizar Jesus, o cordeiro de Deus. E apesar de, em certos países do mundo, a decapitação de João ser uma data celebrada no calendário cristão (29 de agosto), no Brasil nos centramos não na morte, mas na vida. Não no santo morto, mas na criança que nasceu de um milagre. É o ciclo que recomeça e renasce.
A relação começa a se estabelecer quando percebemos os diálogos com as festas de solstício. Por conta dos movimentos de rotação e inclinação da terra, existem momentos do ano em que um dos hemisférios do planeta recebe muito mais sol do que o outro. No solstício de inverno, as noites são mais longas; no de verão, temos os dias mais longos que as noites. Como a Terra demora 12 meses para fazer seu giro completo, a distância entre os dois solstícios é de exatamente seis meses. A mesma distância que separou o nascimento de João e Jesus. Por isso temos o Natal no 25 de dezembro e o Dia de São João no 24 de junho.
Na Bíblia não existe nenhum lugar dizendo que Jesus nasceu efetivamente dia 25 de dezembro. Essa data foi uma convenção, discutida depois de muita interpretação dos textos. O que guiou essa leitura foi uma frase dita por João. Depois que seus discípulos descobrem que Jesus, que havia sido batizado por ele, agora também estava batizando pessoas, seu primo esclarece: “É necessário que ele cresça e eu diminua” (Jo 3,30). Na metáfora, seria uma forma de entender o avanço da noite no Hemisfério Norte, que vai ficando mais e mais longa até chegar ao seu ápice no dia 21 de dezembro. A igreja celebra Jesus no dia 25 pois é quando o sol torna a subir, vencendo a escuridão.
No Brasil, por outro lado, estamos no Hemisfério Sul. O dia mais escuro do ano ocorre justamente nas proximidades do São João, que vem romper as trevas com suas fogueiras. Com o fim das noites mais longas, o momento é de celebrar com muita fartura, comida, bebida, música e dança. A sazonalidade explica as festas de colheita que existem em todos os povos no mesmo período. Acompanhando a ideia da fertilidade da terra vem as celebrações da vida: prendas, casamentos falsos, barraca de beijo, correios elegantes para os apaixonados.
Uma tradição que remete à vida do Santo é a prática de banhá-lo nas águas do rio. Os festeiros carregam uma estátua do santinho em um andor até um rio famoso na cidade e banha-se junto com ela nas águas pedindo suas graças. Durante o trajeto, é comum passar embaixo do andor também para pedir por sua intercessão (especialmente casamentos). Depois do banho do santo, os devotos celebram com muita festa.
No entanto, o santo é conhecido mesmo pela sua ligação com o fogo. Tanto que é sincretizado com o orixá Xangô – que, inclusive, partilha com ele o dia da festa, no 24 de junho. Acender fogueiras e estourar fogos de artifício em sua homenagem viraram sinônimos de festa de São João. Balões também, até serem proibidos, faziam parte da manifestação. Mas qual seria o motivo?
Uma das explicações tradicionais aqui no Brasil diz que acendemos fogueira de São João em homenagem ao seu nascimento. Conta-se que nos tempos bíblicos Isabel, mãe de João, e Maria estavam grávidas ao mesmo tempo. Como moravam em casas distantes, a primeira que ganhasse bebê deveria anunciar as novidades acendendo uma grande fogueira em frente de casa. João Batista nasceu primeiro e sua mãe cumpriu com o prometido.
No entanto, no livro Legenda Dourada, que reuniu no século XIII, já se falava que a tradição existia na Europa. O comum, na época, era acender fogueira com ossos de animais para espantar espíritos e dragões. A referência é que os ossos de João teriam sido queimados pelos infiéis depois de sua morte.
Câmara Cascudo, no entanto, aponta para outra tradição que nos lembra do pedido feito na cantiga: “São João está dormindo Não acorda, não! Acordai, acordai, acordai, João!”. Isabel, mãe de João, colocaria seu filho para dormir de propósito justamente na data do seu aniversário. O pesquisador explica:
“O santo, segundo a tradição, adormece durante o dia que lhe é dedicado tão ruidosamente pelo povo, através dos séculos e países. Se ele estiver acordado, vendo o clarão das fogueiras acesas em sua honra, não resistirá ao desejo de descer do céu para acompanhar a oblação, e o mundo acabará pelo fogo”.
Ainda assim, brincamos com o perigo. Acendemos fogueira, estouramos rojões, tudo para fazer o santo descer e vir festejar conosco.
DESPERTAR DE JOÃO
Tipo: Desafio
Elemento: Firmeza
Condição de Vitória:
Some 12 ou mais PVs do seu lado do campo. Quando o valor for atingido, todas as suas cartas em campo vão para o Beleléu.
Efeito:
Envie uma carta para o Beleléu, para poder enfrentar o Desafio.
Artista: Daniel Brás
– CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. São Paulo: Global, 2002.
– SIMAS, Luiz Antônio. Santo de casa: fé, crenças e festas de cada dia. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2022.
– VARAZZE, Jacopo de. Legenda Áurea. Vidas de Santos. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.