Parteira

PARTEIRA

Relatório

Mãos calejadas pelo trabalho não poderiam ser mais gentis na hora de conduzir uma nova vida ao mundo. Este é o trabalho das parteiras, que embalam, com cantos, rezas, ervas e movimentos precisos da mão, o nascer do rebento. Cada detalhe do pré-natal popular é acompanhado com atenção e afeto por essa mestra dos saberes tradicionais; fundamental, especialmente para as mulheres em lugares onde a saúde pública é deficiente.

Para aliviar o sofrimento da mãe, é muito comum que as parteiras forrem o leito do parto com couro de gambá (ou sariguê). Ou, ainda, que passem a banha do animal sobre a barriga da mulher. O costume remete a um conto popular cristão do ciclo da fuga para o Egito. Nele, dizem que, enquanto escapavam dos soldados de Herodes, José e Maria se viram tão estressados, que o leite da mãe de Jesus secou.

Desesperada, vendo o filho com fome, ela pediu ajuda aos animais da terra. O único que se aproximou foi a gambá fêmea, que deixou o menino Jesus se alimentar de seu leite. Em agradecimento, Maria a abençoou para que sua prole nunca sofresse das dores do parto. O uso da gordura do gambá nos partos de hoje é uma simpatia: uma ação no mundo físico que busca um efeito mágico.

Além de acompanhar o próprio parto, outra das tarefas da parteira é orientar sobre o corpo feminino, tanto no que diz respeito aos ciclos menstruais quanto no período de resguardo (ou puerpério). A parteira Zenaide de Souza Carvalho, no Acre, por exemplo, tem um projeto em que ensina a confecção de absorventes caseiros. O objetivo é combater a chamada “pobreza menstrual”, oferecendo mais dignidade a essas pessoas.

Quando se está menstruada, é preciso tomar especial cuidado, pois diz-se que o corpo fica aberto às más influências. Por isso, não se deve passar por cima de lixo ou espojo de animais. Também é preciso estar atenta aos seres do entorno: na Amazônia, dizem que o Boto-Cor-de-Rosa é atraído pelo cheiro das mulheres menstruadas e é capaz de engravidá-las apenas com um olhar. Outro animal que dizem engravidar é a taturana, que é atraída pela urina com sangue e acaba levando a mulher a óbito, com uma barriga cheia de lagartas.

Para evitar cólicas menstruais, existe uma série de estratégias, sejam elas rezas, remédios ou simpatias. Uma das mais simples consiste em dispor em cruz duas folhas de coentrão (Eryngium foetidum) embaixo do lençol da mulher. No dia seguinte, é só tirar e jogar fora. A cólica se vai junto das folhas.

No pós-parto, uma das grandes queixas das mulheres é quanto à presença da Mãe do Corpo ou Dona do Corpo, que é como se chama a entidade que ficava cuidando do bebê no ventre feminino. Depois que ele nasce, ela continua procurando a criança, gerando movimentos na barriga. Esta é uma das explicações tradicionais para os órgãos que vão voltando para suas posições originais, após o nascimento.

Quanto ao ofício das parteiras, vale um alerta. Engana-se quem pensa que este saber tradicional é um contrassenso aos avanços da medicina ou da ciência. A Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que 85% dos partos podem ocorrer sem intervenção médica alguma. Uma figura disposta a fornecer atenção, orientação e afeto é um grande diferencial, especialmente em comunidades onde o acesso aos serviços básicos é dificultado.

As boas parteiras, todavia, sabem a hora de encaminhar a parturiente para um médico. Se o bebê está em uma posição que a parteira não consegue virá-lo e reposicioná-lo apenas com as mãos, a cesariana é necessária. No Brasil, no entanto, os números assustam: aproximadamente 55% dos nascimentos são feitos dessa forma. Essa é a segunda maior taxa de partos por cesárea no mundo inteiro.

PARTEIRA
Pontos de Força: 2
Pontos de Vida: 4

Tipo: Gente
Elemento: Água

Habilidade:
Quando esta carta é invocada, você pode, excepcionalmente, invocar uma segunda carta do tipo Gente.

Efeito: Dobradinha

Citação: "Com uma barriga pontuda dessas? Já pode encomendar o enxoval, certeza que é menino."

Artista: Nilberto Jorge

Carta da Parteira, com ilustração de uma senhora parteira com roupa roxa, um pano amarelo nos ombros, cabelo branco e segurando um recém-nascido. Ela olha com cara fechada para o boto cor de rosa de chapéu branco que está na janela no lado de fora, o boto está com cara de sem-graça. Frente à janela uma mesa com uma vela acesa e uma bacia com água e um pano.

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Fontes

– CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. São Paulo: Global, 2012.
– LEWINSOHN, Ilana. Jaçanã − causos e a vida de uma pajé pataxó. São Paulo: Baraúna, 2016.
– SILVA, Eduarda. Partejar e narrar: o ofício de parteira ao sul do Rio Grande do Sul (1960-1990). Porto Alegre: Editora Fi, 2021.
– XIDIEH, Oswaldo Elias. Narrativas Pias Populares. São Paulo: Itatiaia, 1993.