BENZEDEIRA
Relatório
Com dois te botaram, com três eu te tiro.
Com três eu te benzo, com três eu te curo.
A lógica que orienta um dos motes mais frequentes em um benzimento nos ajuda a compreender este ofício sagrado. O “dois” faz referência aos olhos, ao mau-olhado que se coloca sobre uma pessoa, infligindo nela todas as consequências negativas. Para livrar a pessoa do quebranto, é preciso recorrer ao divino. Aí é que entra a trindade: Pai, Filho e Espírito Santo.
Por tradição, as benzedeiras dizem que não são elas que fazem sarar; apenas canalizam as forças divinas. É por isso que não costumam aceitar pagamento pela cura recebida; no máximo, presentes. Afinal, tornar-se benzedor é aceitar uma missão. Abraçar o dom recebido desde o nascimento, mas que precisa ser estimulado.
E quem são estas pessoas e que papel cumprem no plano social? Edmilson Pereira e Núbia Gomes, em “Assim se Benze em Minas Gerais” (2018), descrevem:
“A benzedeira e o benzedor se destacam como agentes sociais que desempenham – no meio rural ou na periferia dos centros maiores – a função de mantenedores do equilíbrio do homem e do mundo. Embora possam receitar ervas e chás como medidas complementares, a benzedeira e o benzedor curam pelo poder da palavra e seu trabalho não é remunerado, ainda que as condições de sobrevivência material lhe sejam geralmente difíceis e, em muitos casos, penosas”.
O que pode ser benzido? Tudo. Não apenas doenças de gente, mas também dos bichos. É possível se benzer também contra animais (feras, picadas de cobra) ou benzer terrenos para afastar as pragas, mandando serpentes e formigas embora. Benze-se até mesmo para trazer a chuva.
Das moléstias, inclusive, há todo um arcabouço próprio. Além do quebrante, é possível tratar zipra (ou erisipela); vento ou ventre virado; dor de veado (ou dor desviada); cobrão ou cobreiro (herpes-zóster) e muitas outras.
As palavras ditas em cada benzimento variam muito. Por padrão, elas são mais sussurradas do que amplamente anunciadas, mantendo uma relação de privacidade e mistério. Além das orações tradicionais, é comum sempre enviar todo o mal para o “mar vazante” ou variações parecidas. O objetivo é de que as águas salgadas do oceano ajudem a purgar todas as energias ruins.
Por vezes, existe ainda um canto ou cômodo específico da casa onde o benzimento é feito, como para canalizar as preces entoadas. Ao mesmo tempo, já é comum o benzimento a distância. Se, no passado, benzia-se “no rumo” – ou seja, virando-se na direção do objeto de cura, mesmo que há quilômetros de distância –, nos dias de hoje, já se institui também o benzimento mediado pela internet como possibilidade.
Valioso apontar que, comumente, como afirma Dulce Mendes: “As benzedeiras e os benzedeiros praticantes de religiões afro-brasileiras não desconsideram a intermediação dos santos católicos, aos quais invocam com preces e orações desta denominação religiosa”. O mesmo, no entanto, nem sempre acontece, devido ao forte racismo religioso que permeia o país.
BENZEDEIRA
Pontos de Força: 1
Pontos de Vida: 6
Tipo: Gente
Elemento: Vento
Habilidade:
Quando esta carta é invocada, todas as cartas Visagem, em campo, voltam para a Mão das pessoas.
Efeito: Retorno
Citação: "Com dois te botaram, com três eu te tiro. Com três eu te benzo, com três eu te curo."
Artista: Bruno Brunelli
Fontes
– ILHEO, Mariana de Carvalho. Benzimento em Movimento: Materialidade, bençãos e curas no Sul de Minas Gerais. São José dos Campos: FCCR/CECP, 2022.
– MENDES, Dulce. Com um te botaram com dois eu te tiro! Um estudo sobre as benzedeiras e dos benzedeiros moradores das comunidades quilombolas de Igreja Nova – Alagoas. Tese (Doutorado). Programa de Pós-Graduação em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social. UFRJ, 2017.
– PEREIRA, Edmilson de Almeida; GOMES, Núbia Pereira de Magalhães. Assim se benze em Minas Gerais. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2018.