Pisadeira

PISADEIRA

Pisadeira, por Stuart Marcelo

Relatório

Por aí vedes o Pesadelo?
Pelo tubo das chaminés
Desce furtivamente sobre o peito úmido
Do adormecido que cai;
Mudo, se agacha, o oprime
Como uma torre e o encabresta
De sonhos que fazem horror e dolorosos.
– Miréio, por Frédéric Mistral (1859)

Pisadeira é uma visagem que representa a personificação do pesadelo na cultura popular brasileira. Normalmente é descrita como sendo uma velha bruxa, de unhas enormes. O monstro aguarda as altas horas da noite, quando desce sobre aqueles que dormem de barriga para cima e, então, solta todo seu peso sob o tórax da pessoa. Indefesa, a vítima passa a ter sonhos horríveis, que alimentam a bruxa. Caso acorde no meio do processo, a pessoa perceberá que não consegue se mover. É vítima, afinal, da paralisia do sono.

Outras versões vão falar de um velho, homem, chamado apenas de Pesadelo. Narrativas de Pesadelo e de Pisadeira se misturam, gerando inclusive variações da mesma música de esconjuro: “Pisadeira, Pisadeira, da mão furada. Suas unhas ultrapassadas. Se quiser vir me assombrar, dê três voltas pelo mar”. Normalmente é o Pesadelo, masculino, quem tem as mãos furadas – e, com elas, sufoca a pessoa na cama. Ela não morre, pois ainda consegue respirar pelas mãos vazadas, mas tem uma dificuldade enorme de respirar. Enviar para o mar, por sua vez, é um mote clássico de benzimento para se livrar de tudo o que é ruim nas águas salgadas purificadoras. Dar três voltas por todo o mar é uma tarefa impossível, mesmo para um espírito, o que garante a paz noturna.

Em Portugal, fala-se do Insone, um duende noturno com furos nas mãos e carapuça vermelha. Ele causa paralisia do sono também, mas se você conseguir se movimentar e tomar-lhe o gorro mágico (como no caso dos sacis brasileiros), receberá grandes riquezas. O imaginário mistura narrativas, fazendo com que algumas Pisadeiras e Pesadelos também sejam descritos vestindo gorros vermelhos. Outras derivações vão falar já não de carapuça, mas de um “homem de chapéu”.

Wilson Lins, que escreveu sobre a cultura do médio São Francisco, registra a “Pesadeira”: uma feiticeira que senta em cima de quem dorme de barriga para cima. O monstro usa uma touca vermelha e, sem ela, perde força e fica leve como uma criança de peito. Como prêmio, exigiu da visagem que sua casa virasse um palácio, sua carroça uma carruagem e suas roupas vestes dignas de um rei.

Como levanta Câmara Cascudo, em diversas culturas o pesadelo é personificado com formas humanas. É, por vezes, um gigante, em outras um anão; homem ou mulher horrendo; tem ou não comportamentos sexuais (como um incubus ou sucubus). A relação, de qualquer maneira, está sempre ligada à pressão. Pesadelo em português, por sinal, é derivado da palavra “pesado”, ou seja, remete àquela sensação de peso sobre o peito que só um pesadelo dos bons pode causar.

Em inglês, a palavra para pesadelo é “nightmare”, que também tem uma etimologia que remete ao fantástico. “Night”, é noite; já “mare” vem do inglês antigo, maere, termo utilizado para identificar espíritos malignos femininos que sufocavam as pessoas durante o sono. Em norueguês, por exemplo, pesadelo é “mareridt”; em islandês martröð. Ambos significam algo como “corrida de Mare”.

Mahrs, Mares ou Marras; encontramos este nome e suas derivações em diversos países da Europa, sempre relacionados a espíritos que atacam os sonhos dos humanos. Dizem ainda que elas costumam montar cavalos, fazendo com que amanheçam cansados e suados. Também são conhecidas por dar nó nas crinas de cavalos e nos cabelos das pessoas (Marelocks), algo que no Brasil é um feito típico dos sacis, das bruxas ou das comadre fulozinhas.

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