Boi da Cara Preta

BOI DA CARA PRETA

Relatório

O Boi da Cara Preta é um personagem das cantigas populares que pertence ao ciclo da angústia infantil. Ele não possui forma definida nem uma narrativa que o oriente. Todavia, justamente por estar incrustado nas memórias mais antigas de tantos brasileiros, sua figura se cristaliza no imaginário.

Tudo o que é preciso saber sobre ele está inscrito na sua cantiga: “Boi, boi, boi. Boi da cara preta. Pega esse menino que tem medo de careta”. Em algumas versões, a música tem uma continuação: “Não, não, não. Não o coitadinho. Ele está chorando porque é bem bonitinho”.

A música se insere em um braço das tradições populares conhecidas como as “cantigas de acalanto”, que são aquelas utilizadas para embalar as crianças ao dormir. Sendo este o caso, qual seria a lógica de cantar algo para assustar as crianças ao invés de acalmá-las? Oras, é que o que vai embalar o sono é o ritmo da voz, o movimento dos braços e, é claro, a presença e confiança da figura responsável por botar as crianças na cama.

Para além disso, o medo simbolizado é também uma ótima oportunidade para a criança experienciar, desde cedo, a distinção entre o que é dito e o que é falado. Nenhum pai quer verdadeiramente entregar seu filho para o Boi, por mais malcriado e careteiro que ele seja, assim como ninguém quer que a Cuca leve aquele que não dorme cedo.

Os bois na tradição brasileira
Podemos tomar um tempo, agora, para pensar em como o boi é um personagem quase onipresente na cultura popular brasileira. Está presente em nossos folguedos, está presente em nossas visagens, em nossas trovinhas e em nossos contos populares. Nomes de bois ficaram famosos pelas narrativas tradicionais, ao ponto de, ainda hoje, serem lembrados.

É o caso do Boi-Espácio − registrado em 1885, por Sílvio Romero −, o qual era tão grande, que seus miolos alimentaram uma cidade inteira e ainda sobrou para a cachorrada. Causos de bois que são os mais queridos do patrão e que são mortos a pedido de uma bela mulher dão origem, em alguns lugares, ao enredo do Bumba Meu Boi. Em outros, vão ser contados como a história do Boi Leição.

Disputas entre um vaqueiro e um boi ou touro encantado também são muito conhecidas, mostrando a tenacidade do homem diante da natureza indomada. No Rio Grande do Sul, uma das mais conhecidas é a história do Boi das Aspas de Ouro – sendo que aspas é uma das formas de se referir aos chifres do animal.

Podemos lembrar ainda dos bois que fizeram sucesso na música popular brasileira. A “Moda do Boi Amarelinho” foi a primeira música que Inezita Barroso tocou na viola, quando ainda tinha 10 anos de idade. Ela começa assim: “Eu sou aquele boizinho / Que nasceu no mês de maio / Desde que nasci no mundo / Foi só pra sofrê trabaio”.

A relação entre o ser humano e o boi, na música, muitas vezes é de aproximação e de reconhecimento. Como metáfora para dois trabalhadores que, depois de velhos, já não servem mais para o patrão ou a família. Músicas que fazem sempre o peão se emocionar são os clássicos “Couro de Boi”, de Palmeira e Teddy Vieira, e “Herói sem Medalha”, composta por Sulino.

O boi é essa representação da natureza que, sob o controle humano, permite o arar da terra, a alimentação e reprodução. Descontrolada, esta natureza se torna o boi indomado, pronto para perseguir o peão. Ou, em nosso caso, o boi-fantasma, que atravessa nossos sonhos em carreira, para nos perseguir.

BOI DA CARA PRETA
Pontos de Força: 3
Pontos de Vida: 3

Tipo: Visagem
Elemento: Terra

Habilidade:
Quando esta carta é invocada, você deve escolher uma carta Gente, em campo, para enviar para o Beleléu.

Efeito: Quebranto

Citação: "Não, não, não. Não o coitadinho. Ele está chorando porque é bem bonitinho."

Artista: Waldeir Brito

Carta do Boi da Cara Preta com ilustração mostrando de frente um boi escuro e assustador, ele está abrindo a boca com uma luz flamenjante saindo da boca e dos olhos. Ele tem chifres cinzas e ameaçadores. Um fundo escuro com iluminação ao redor do boi.

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Fontes

– CASCUDO, Luís da Câmara. Literatura Oral no Brasil. São Paulo: Global, 2015.
– ROMERO, Silvio. Contos Populares do Brasil. Lisboa: Nova Livraria Internacional, 1885.